Muito embora não saibamos
exatamente qual a origem dessa ligação entre o gênero musical rock
and roll e o Adversário de nossas
almas, fato é que essa é uma ideia que faz parte do inconsciente
coletivo da humanidade. Alguns nisso creem piamente, condenando
sumariamente tal ritmo e todos os seus apreciadores ao inferno. Já
outros, embora discordem, continuam a afirmar tal premissa, mesmo que
de maneira jovial.
Para melhor compreensão desse
pensamento, se faz necessário lembrarmos a origem do rock. Suas
raízes estão estabelecidas em outro ritmo, o blues, que por sua vez
provém dos spirituals
e narrativas tradicionais africanas. A “sala de parto” do blues
foi o extremo sul dos Estados Unidos, mais especificamente os Estados
do Alabama, Mississipi, Louisiana e Geórgia. Já as “parteiras”,
foram os escravos que, no século XIX, eram empregados nas plantações
de algodão daquela região, e utilizavam tal ritmo para expressar
sua tristeza face às longas jornadas de trabalho a que eram
submetidos. Lembremos que blues, no inglês, tem como sinônimas as
palavras melancolia e tristeza.
O primeiro bluesman que ficou
conhecido por citar o diabo em suas composições foi Robert Johnson,
na década de 1930. Johnson, aliás, supostamente fez um pacto para
obter fama e dinheiro através da música.
Já na década de 1970,
despontaram algumas bandas fortemente influenciadas pelo blues
elétrico, tais como Led Zeppelin e Black Sabbath, precursores do
gênero que ficou conhecido como heavy metal. Mais especificamente o
Black Sabbath, apresentava letras e arte visual de seus álbuns
explicitamente voltadas às referências satânicas. Já o Led
Zeppelin, embora possuísse temática variada, mormente é lembrada
como adepta de ensinamentos ocultistas e pelas supostas mensagens
subliminares em suas músicas.
Ao longo dos anos, várias
vertentes do rock surgiram – thrash
metal, death metal, black metal,
dentre outros –, com alguns de seus representantes usando e
abusando de letras e visual “do mal”, por vezes de maneira
espalhafatosa, caricata e mesmo pueril, se autodeclarando servos de
satanás. Querem parecer assustadores mas conseguem, no máximo,
serem ridículos, com suas maquiagens e indumentárias inspiradas em
filmes de terror de quinta categoria.
Mais recentemente, tais recursos
tem sido ad nauseam
explorados pela banda norte-americana Marilyn Manson, liderada por
Brian Hugh Warner, vocalista que assume o mesmo epíteto do grupo.
Apesar de muitos de fato
acreditarem na balela apresentada por tais bandas e cantores, é
óbvio que tudo se trata de mera jogada de marketing, com vistas ao
filão do mercado composto por jovens descerebrados, rebeldes sem
causa e mimadinhos de classe média que intentam chocar seus pais e a
sociedade com seu visual e preferência musical, mas que conseguem
apenas serem mais uma dentre as tribos urbanas frequentadoras de
shopping center.
Lembremos que, à luz das
Escrituras, satanás utiliza a própria Palavra de Deus para tentar
ludibriar o homem e induzi-lo ao erro e ao engano. Foi assim com
nossos primeiros pais no Éden (Gênesis 3), bem como na tentação
de Jesus (Mateus 4). Ele “anda em
derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar”
(I Pedro 4.8). Muitas vezes, ele usa pessoas acima de qualquer
suspeita para levar a efeito seus desígnios malignos. No caso de Jó,
usou a própria esposa do patriarca, a qual foi chamada por Calvino
de organum satani 1.
Ele tem a seu serviço falsos pastores e falsos mestres, que
diariamente se utilizam da mídia para extorquir dinheiro dos fiéis
e construir seus impérios pessoais. Eles estão também nas igrejas
locais, disseminando heresias e causando divisões.
Esqueça aquela imagem do diabo
com a qual você está acostumado e que ilustra as capas dos álbuns
e os souvenires ligados a tantas bandas de rock. Tal imagem está
mais relacionada a figuras lendárias e à mitologia do que à
descrição do adversário apresentada na Bíblia. Esta, aliás, não
apresenta pormenores sobre a aparência do inimigo de nossas almas.
No entanto, no Antigo Testamento
há dois textos que por vezes são apresentados em prédicas e
estudos como sendo referências veladas a Satanás. São eles: Isaías
14.12-23 e Ezequiel 28.12-19. Vejamos:
Como caíste do céu, ó
estrela da manhã, filho da alva! Como foste lançado por terra, tu
que debilitavas as nações! Tu dizias no teu coração: Eu subirei
ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono e no monte
da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte; subirei
acima das mais altas nuvens e serei semelhante ao Altíssimo.
(Isaías 14.12-14)
Filho do homem, levanta uma
lamentação contra o rei de Tiro e dize-lhe: Assim diz o SENHOR
Deus: Tu és o sinete da perfeição, cheio de sabedoria e formosura.
Estavas no Éden, jardim de Deus; de todas as pedras preciosas te
cobrias: o sárdio, o topázio, o diamante, o berilo, o ônix, o
jaspe, a safira, o carbúnculo e a esmeralda; de ouro se te fizeram
os engastes e os ornamentos; no dia em que foste criado, foram eles
preparados. Tu eras querubim da guarda ungido, e te estabeleci;
permanecias no monte santo de Deus, no brilho das pedras andavas.
Perfeito eras nos teus caminhos, desde o dia em que foste criado até
que se achou iniquidade em ti. Na multiplicação do teu comércio,
se encheu o teu interior de violência, e pecaste; pelo que te
lançarei, profanado, fora do monte de Deus e te farei perecer, ó
querubim da guarda, em meio ao brilho das pedras. Elevou-se o teu
coração por causa da tua formosura, corrompeste a tua sabedoria por
causa do teu resplendor; lancei-te por terra, diante dos reis te pus,
para que te contemplem. (Ezequiel
28.12-17)
Muito embora possa parecer que os
textos em questão se refiram a Satanás, os contextos apontam
claramente para o rei da Assíria (no caso de Isaías) e para o rei
de Tiro (para a profecia de Ezequiel). Logo, qualquer interpretação
que fuja disso é mera conjectura, apesar de que inclusive alguns
pastores reformados defendem a tese de que os textos em apreço são
referências ao Inimigo.2
No time daqueles que discordam disso, cito J.I. Packer, o qual afirma
que
Alguns têm pensado que os termos
com que são descritos os orgulhosos reis de Tiro e de Babilônia, em
Ezequiel 28.11-19 e Isaías 14.12-14, respectivamente, devem sua
origem às narrativas tradicionais da queda de Satanás, cuja imagem
aqueles arrogantes reis estampavam de maneira notável; mas essa
opinião não pode ser provada.3
Quanto à aparência do diabo e
seus legionários impressa no inconsciente coletivo dos cristãos,
temos algumas possíveis explicações: as asas de dragão são
baseadas na descrição metafórica de Apocalipse 20.1,2: "Então,
vi descer do céu um anjo; tinha na mão a chave do abismo e uma
grande corrente. Ele segurou o dragão, a antiga serpente, que é o
diabo, Satanás, e o prendeu por mil anos [...]."
Os pés, os chifres e a barba,
podem ter inspiração nos sátiros, seres mitológicos, ou ao deus
grego Pã. Já a cor vermelha, uma das cores quentes, alude ao fogo.
Na “Divina Comédia”, Dante Alighieri o descreve como um ser
peludo portador de três cabeças, com asas enormes semelhantes às
dos morcegos.
Gostaria de ilustrar o presente
capítulo com uma frase atribuída ao Rev. Augustus Nicodemus
(desconheço a fonte):
"Quando Judas ficou
possesso por satanás, não caiu no chão, não revirou os olhos, não
falou em voz diferente, não ficou doente ou encurvado, não ganhou
uma força descomunal. Simplesmente saiu e foi ganhar dinheiro
vendendo Jesus aos sacerdotes (Lucas 22.3-6). Tem muito mais gente
possessa por satanás do que se pensa."
Parafraseando:
Quando uma pessoa está a serviço
de satanás, ela não vai ouvir rock'n'roll. Ela sai e vai estuprar,
matar. Dentre esses, vemos distintos senhores muitíssimo bem
trajados e ocupando cargos importantes na sociedade, fãs de samba e
pagode cujo passatempo é abusar sexualmente de crianças e
adolescentes. Jovens de classe média-alta, ouvintes de sertanejo
universitário, que matam os pais para ficar com a herança. Pais fãs
de MPB que maltratam e até mesmo tiram a vida de seus filhos por
motivos fúteis. Políticos apreciadores de música clássica que
desviam verbas destinadas à saúde e a educação, fazendo com que
milhares de pessoas padeçam por conta de sua inconsequência. Tem
muito mais gente possessa por satanás do que se pensa.
Talvez alguém possa afirmar que o
ritmo musical ora em pauta tenha o poder de influenciar negativamente
seus ouvintes. Mas, dependendo do conteúdo lírico, qualquer outro
ritmo musical pode exercer esse poder.
(Quanto à paráfrase acima
apresentada, quero deixar claro que nada tenho contra quaisquer
gêneros musicais. Ilustrei minha fala com diferentes ritmos para
expor a ideia de que o mal não está atrelado à música que se
houve, mas à corrupção do coração do homem.)
1Instrumento
de satanás, em latim.
2Hernandes
Dias Lopes e Paulo Anglada são dois exemplos. Vide o comentário
bíblico “2 Pedro e Judas” (p. 64), escrito pelo primeiro, e
“Soli Deo Gloria” (p. 206), de autoria do segundo.
3J.I.
Packer. “Vocábulos de Deus”, p. 132.
(Texto extraído do meu livro "A realidade do sofrimento eterno - E como escapar dele", disponível no Clube de Autores).
Soli Deo Gloria
Alessandro Silva