O título do blog tem amplo significado. Tanto o autor como o presente espaço estão em constante construção.
(Afinal, somos seres inconclusos...). O blog vem sendo construído periodicamente - como todo blog - através da postagem de textos, comentários e divagações diversas (com seu perdão pela aliteração).

sábado, 14 de março de 2020

terça-feira, 29 de outubro de 2019

O suicídio e a Bíblia


O suicídio acontece com muito mais frequência do que imaginamos. Estima-se que uma pessoa se suicida a cada 40 segundos no mundo e a cada 45 minutos no Brasil[1]. São 2160 suicídios por dia no mundo, sendo 32 deles no Brasil.
Parece-me algo que se encontra insculpido no inconsciente coletivo da cristandade: “os suicidas não herdarão o Reino dos Céus”. No entanto, não há base bíblica para se afirmar tal assertiva com tanta convicção. Mormente, relaciona-se o suicídio ao homicídio, e como o mandamento é taxativo em afirmar “Não matarás”, logo, ao dar cabo à própria vida, o suicida assina seu passaporte para a condenação eterna. Certo? Errado.
Via de regra, imputa-se a perdição eterna aos suicidas levando-se em consideração alguns dos casos bíblicos em que o personagem pôs fim à própria existência. Vejamos:
1) Saul e seu escudeiro (I Samuel 31.1-5):
Entretanto, os filisteus pelejaram contra Israel, e, tendo os homens de Israel fugido de diante dos filisteus, caíram feridos no monte Gilboa. Os filisteus apertaram com Saul e seus filhos e mataram Jônatas, Abinadabe e Malquisua, filhos de Saul. Agravou-se a peleja contra Saul; os flecheiros o avistaram, e ele muito os temeu. Então, disse Saul ao seu escudeiro: Arranca a tua espada e atravessa-me com ela, para que, porventura, não venham estes incircuncisos, e me traspassem, e escarneçam de mim. Porém o seu escudeiro não o quis, porque temia muito; então, Saul tomou da espada e se lançou sobre ela. Vendo, pois, o seu escudeiro que Saul já era morto, também ele se lançou sobre a sua espada e morreu com ele.
Como sabemos, Saul levou uma vida marcada por atos de desobediência. Conforme texto bíblico acima, suicidou-se para não ser capturado pelos filisteus durante uma batalha cuja derrota era iminente. O exato motivo de sua morte está registrado em I Crônicas 10.13,14:
Assim, morreu Saul por causa da sua transgressão cometida contra o SENHOR, por causa da palavra do SENHOR, que ele não guardara; e também porque interrogara e consultara uma necromante e não ao SENHOR, que, por isso, o matou e transferiu o reino a Davi, filho de Jessé.
 Um abismo chama outro abismo (Salmos 42.7). Os abismos da vida de Saul culminaram com seu suicídio. Mas, e quanto a seu escudeiro? A Bíblia não apresenta detalhes quanto à sua vida pregressa. Dessa maneira, podem se tratar de dois casos totalmente distintos, ocorridos em um pequeno intervalo: enquanto o primeiro foi o ápice de uma vida sem Deus, o segundo pode ter sido meramente uma questão de desespero momentâneo.
2) Aitofel: avô de Bate-Seba, manteve ligação com o rei Davi, até que o monarca adulterou com sua neta. Quando Absalão intentou tomar o reino de seu pai, Aitofel conspirou contra Davi, solicitando um exército de doze mil homens e autorização para persegui-lo. Absalão, porém, tomou conselho com Husai e seguiu-o, por considerá-lo mais sábio. Então, “Vendo, pois, Aitofel que não fora seguido o seu conselho, albardou o jumento, dispôs-se e foi para casa e para a sua cidade; pôs em ordem os seus negócios e se enforcou; morreu e foi sepultado na sepultura do seu pai” (2 Samuel 17.23).
3) Judas Iscariotes: único suicida mencionado no Novo Testamento, e provavelmente o caso mais conhecido da Bíblia – quiçá da História. O referido personagem tornou-se mundialmente conhecido como o traidor e o filho da perdição, muito embora Jesus Cristo tenha se entregado voluntariamente como sacrifício por nossos pecados: “Por isso, o Pai me ama, porque eu dou a minha vida para a reassumir. Ninguém a tira de mim; pelo contrário, eu espontaneamente a dou. Tenho autoridade para a entregar e também para reavê-la. Este mandato recebi de meu Pai” (João 10.17,18).
Quanto ao suicídio de Judas, temos dois relatos. O primeiro está registrado no Evangelho segundo Mateus, 27.3-5, e o segundo em Atos 1.16.20.
Então, Judas, o que o traiu, vendo que Jesus fora condenado, tocado de remorso, devolveu as trinta moedas de prata aos principais sacerdotes e aos anciãos, dizendo: Pequei, traindo sangue inocente. Eles, porém, responderam: Que nos importa? Isso é contigo. Então, Judas, atirando para o santuário as moedas de prata, retirou-se e foi enforcar-se. (Mateus 27.3-5)

Irmãos, convinha que se cumprisse a Escritura que o Espírito Santo proferiu anteriormente por boca de Davi, acerca de Judas, que foi o guia daqueles que prenderam Jesus, porque ele era contado entre nós e teve parte neste ministério. (Ora, este homem adquiriu um campo com o preço da iniqüidade; e, precipitando-se, rompeu-se pelo meio, e todas as suas entranhas se derramaram; e isto chegou ao conhecimento de todos os habitantes de Jerusalém, de maneira que em sua própria língua esse campo era chamado Aceldama, isto é, Campo de Sangue.) Porque está escrito no Livro dos Salmos: Fique deserta a sua morada; e não haja quem nela habite; e: Tome outro o seu encargo. (Atos 1.16-20)
Concilia-se os dois relatos da seguinte forma: Judas enforcou-se e, face à altura e posicionamento da forca, após o ato a corda arrebentou-se, o que acarretou no rompimento de seu corpo já sem vida e o consequentemente derramamento das entranhas. Não há qualquer disparidade entre os textos, como apontam alguns.
Judas findou por ser o arquétipo do suicida desafortunado e condenado.
4) Sansão: propositalmente, deixei-o por último. Isso porque, por vezes, ele não é lembrado como um suicida, mas sim como um herói da fé, digno de entrar na galeria de Hebreus 11 ao lado de Abel, Enoque, Noé, Abraão Moisés, Samuel e outros.
Mormente também é lembrado como aquele que, conquanto nazireu desde o ventre, separado para o serviço sagrado, viu-se em conflito com o voto de nazireado ao longo de toda sua vida.
Resumindo a história: quando enfim Dalila, a serviço dos filisteus, conseguiu convencê-lo a contar-lhe o segredo de sua grande força, Sansão teve seu cabelo cortado com “máquina zero”, como diríamos hoje, e então o Senhor retirou-se dele. A partir daí Sansão foi aprisionado pelos filisteus e tornou-se motivo de escárnio dentre os inimigos. Vejamos o que a Bíblia nos diz sobre seus últimos momentos:
Alegrando-se-lhes o coração, disseram: Mandai vir Sansão, para que nos divirta. Trouxeram Sansão do cárcere, o qual os divertia. Quando o fizeram estar em pé entre as colunas, disse Sansão ao moço que o tinha pela mão: Deixa-me, para que apalpe as colunas em que se sustém a casa, para que me encoste a elas.
Ora, a casa estava cheia de homens e mulheres, e também ali estavam todos os príncipes dos filisteus; e sobre o teto havia uns três mil homens e mulheres, que olhavam enquanto Sansão os divertia. Sansão clamou ao SENHOR e disse: SENHOR Deus, peço-te que te lembres de mim, e dá-me força só esta vez, ó Deus, para que me vingue dos filisteus, ao menos por um dos meus olhos. Abraçou-se, pois, Sansão com as duas colunas do meio, em que se sustinha a casa, e fez força sobre elas, com a mão direita em uma e com a esquerda na outra. E disse: Morra eu com os filisteus. E inclinou-se com força, e a casa caiu sobre os príncipes e sobre todo o povo que nela estava; e foram mais os que matou na sua morte do que os que matara na sua vida. Então, seus irmãos desceram, e toda a casa de seu pai, tomaram-no, subiram com ele e o sepultaram entre Zorá e Estaol, no sepulcro de Manoá, seu pai. Julgou ele a Israel vinte anos. [grifei] (Juízes 16.25-31)
Cometeu suicídio, mas tornou-se conhecido como um herói da fé.

Como vimos anteriormente, conquanto o apóstolo Paulo tenha demonstrado opinião tendente a favorecer a pena de morte, quanto ao suicídio era contrário. Por exemplo, quando suas cadeias foram rompidas enquanto ele e Silas louvavam a Deus no cárcere em Filipos e até mesmo os alicerces da prisão foram abalados por um terremoto na ocasião, o carcereiro intentou suicidar-se, temendo que os prisioneiros tivessem fugido, pelo que Paulo interpelou-o em alta voz: “Não te faças nenhum mal, que todos aqui estamos!” (Atos 16.25-28).
Escrevendo aos Coríntios, o apóstolo dos gentios questiona: “Não sabeis que sois santuário de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? Se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá; porque o santuário de Deus, que sois vós, é sagrado” (I Coríntios 3.16,17). E afirma: “Acaso, não sabeis que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo, que está em vós, o qual tendes da parte de Deus, e que não sois de vós mesmos?” (I Coríntios 3.16,17).
Ao traçar a analogia entre o relacionamento esposo/esposa e Cristo/Igreja, Paulo emite outro questionamento: “[...] Quem ama a esposa a si mesmo se ama. Porque ninguém jamais odiou a própria carne; antes, a alimenta e dela cuida, como também Cristo o faz com a igreja” (Efésios 5.28,29).
Todavia, ao longo das Escrituras encontramos alguns servos de Deus de notória e exemplar espiritualidade que, quando deparados com um sofrimento extremo, desejaram ardentemente a morte. Davi, Elias, Jó, Jonas, Jeremias, Moisés. As causas que os levaram ao quadro de depressão são variadas: pecados próprios, pecados da nação, enfermidade, perseguição, desobediência.
Lembremos que o próprio Jesus Cristo afirmou em certa ocasião, quando prestes a ser preso e iniciar seu martírio: “A minha alma está profundamente triste até à morte” (Mateus 26.38; Marcos 14.34). Lucas nos relata que, nessa mesma ocasião, “Então, lhe apareceu um anjo do céu que o confortava. E, estando em agonia, orava mais intensamente. E aconteceu que o seu suor se tornou como gotas de sangue caindo sobre a terra”. (Lucas 22.43,44)
Diante disso, oportuno lembrarmos o que diz o escritor da Carta aos Hebreus: “Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Hebreus 4.15).
Sim, ele passou pelas mesmas aflições que nós, por isso sente compaixão quando apresentamos fraqueza ante as dificuldades. Com seu ato extremo, o suicida não intenta simplesmente acabar com sua vida, mas sim fazer findar o sofrimento. Como bem disse Hernandes Dias Lopes, “há muitas causas que ainda permanecem escondidas no recôndito da alma humana, as quais só Deus, que perscruta os corações, pode diagnosticar”[2].
A Bíblia nos afirma que há um pecado imperdoável: “Mas aquele que blasfemar contra o Espírito Santo não tem perdão para sempre, visto que é réu de pecado eterno” (Marcos 3.29).
Zack Eswine faz a seguinte observação a respeito do suicídio e o pecado imperdoável:
O suicídio não é o pecado imperdoável. O seguidor de Jesus não está perdido por causa desse ato hediondo. Isso dá, a nós que permanecemos, esperança para com aqueles que amamos.
E, no entanto, as tristes consequências permanecem, não só para aqueles que escolheram o suicídio, mas para aqueles que os amavam e foram deixados para trás. Assim como outros pecados estão pagos por Cristo, esse, da mesma forma, também está. Contudo, assim como outros pecados causam danos a nós mesmos e aos outros, esse não é exceção.
Perdemos o futuro que poderíamos ter conhecido. Infligimos danos terríveis àqueles que nos amam e a quem amamos. Entregamo-nos às próprias coisas das quais Jesus nos salvou por sua morte. Perdoado e em casa com ele, sim! Sim! Porém muito ainda deve ser pago e curado por Jesus.[3]
Portanto, não sejamos juízes para condenarmos sumariamente ao inferno aqueles que colocam um ponto final à própria existência terrena. Há um só Legislador e Juiz (Tiago 4.12). E nós, quem somos?


Soli Deo Gloria

Alessandro Silva 

(A presente postagem trata-se de um trecho de meu livro "Matar e morrer à luz das Escrituras". Para adquiri-lo, clique aqui.)


[1] Fonte: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2017/05/25/a-cada-45-minutos-uma-pessoa-se-suicida-no-brasil-dizem-especialistas-na-cas. Acesso em 23 de novembro de 2018.
[2] Lopes, Hernandes Dias. “Suicídio – causas, mitos e prevenções”, p. 119.
[3] Eswine, Zack. A Depressão de Spurgeon, p. 170.

domingo, 7 de abril de 2019

Jesus pregou aos espíritos em prisão?


A frase em epígrafe trata-se de uma das expressões mais controversas do Novo Testamento, devido à sua difícil compreensão. Está contida, implícita ou explicitamente, principalmente nos seguintes textos:

Pois também Cristo morreu, uma única vez, pelos pecados, o justo pelos injustos, para conduzir-vos a Deus; morto, sim, na carne, mas vivificado no espírito, no qual também foi e pregou aos espíritos em prisão, os quais, noutro tempo, foram desobedientes quando a longanimidade de Deus aguardava nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca, na qual poucos, a saber, oito pessoas, foram salvos, através da água (...). (2 Pedro 3.18-20)

Ora, se Deus não poupou anjos quando pecaram, antes, precipitando-os no inferno, os entregou a abismos de trevas, reservando-os para juízo (...). (2 Pedro 2.4)

Resultado de imagem para trevas (...) e a anjos, os que não guardaram o seu estado original, mas abandonaram o seu próprio domicílio, ele tem guardado sob trevas, em algemas eternas, para o juízo do grande Dia (...). (Judas 6)

Algumas possibilidades acerca do tema foram sugeridas ao longo da história da Igreja. Vejamos exemplos:

1) Jesus pregou por intermédio de Noé aos habitantes pré-diluvianos da Terra: ou seja, anunciou a possibilidade de salvação aos contemporâneos do patriarca enquanto os mesmos estavam vivos. Chamou-os ao arrependimento. Mostrou o caminho a ser seguido para escapar da perdição. Porém, como sabemos, aqueles homens fizeram ouvidos moucos às benditas palavras e ao exemplo de Noé e, como consequência, todos pereceram no dilúvio, exceto o patriarca e sete pessoas próximas a ele.
Muito embora o texto de Gênesis 6 não faça menção à pregação de Noé, deduzimos que ela tenha ocorrido com base em textos do Novo Testamento. Exemplos: Mateus 24.37-42; I Pedro 3.20; II Pedro 2.5. Ainda que não utilizando palavras, seu testemunho de vida era o anúncio.
Podemos conjecturar que, àquela época, os oito tripulantes da arca foram os únicos eleitos para a salvação, uma vez que em Gênesis 6.3 o SENHOR afirma: “Farei desaparecer da face da terra o homem que criei, o homem e o animal, os répteis e as aves dos céus; porque me arrependo de os haver feito”. Logo, todo o restante da humanidade daquele período hoje encontra-se no inferno. Seriam os “espíritos em prisão”.
2) Uma segunda posição afirma que, no período entre sua morte e ressurreição, Jesus literalmente pregou àqueles que se encontram no Hades, principalmente aqueles que rejeitaram a salvação à época de Noé. O problema dessa interpretação é que dá azo para uma segunda chance de salvação após a morte, fornecendo subsídio para os defensores do purgatório e contradizendo Hebreus 9.27: “E, assim como aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo, depois disto, o juízo (...)”. Assim, outra possibilidade é que Cristo tenha ali anunciado sua vitória, bem como a condenação eterna daqueles que partiram para o além sem n’Ele crer. Sobre o referido versículo, João Calvino faz a seguinte observação:
Se alguém contestar, dizendo que alguns morreram duas vezes, como sucedeu a Lázaro e a outros, a resposta é simplesmente esta: aqui o apóstolo está falando da condição ordinária dos homens, porém isenta dessa condição os que, por uma súbita mudança, foram poupados da corrupção (I Co 15.51), já que o apóstolo inclui somente aqueles que se encontram no pó por um longo período de tempo, aguardando a redenção de seus corpos.1
Tal posição fornece a base para uma das cláusulas do Credo Apostólico: “Desceu à mansão dos mortos”.
Quanto a tal cláusula, em seu artigo “Descendit ad Inferna: Uma análise da expressão ‘Desceu ao Hades’ no Cristianismo Histórico”2, o pastor presbiteriano Heber Carlos de Campos nos informa que
(...) originalmente a expressão 'descendit ad inferna' não fazia parte do Credo Apostólico. No tempo de Rufino, ela apareceu inserida no Credo, mas não como um acréscimo ao que já havia, sendo apenas uma expressão substitutiva de “crucificado, morto e sepultado.” O Credo de Atanásio (escrito por volta do século V ou VI) segue mais ou menos a mesma ideia do Credo de Aquiléia, onde a expressão 'desceu ao Hades' substitui a expressão 'sepultado', não sendo um acréscimo a ela. Até então, não havia nenhuma modificação significativa na doutrina cristã com respeito à situação da pessoa do Redentor ao morrer, pelo menos nas traduções mais conhecidas do Credo.
Mais adiante, o autor aponta que
A doutrina, que usualmente é chamada de “Descida ao Hades”, desenvolveu-se de forma efetiva na igreja cristã com o passar dos séculos, numa tentativa de reviver a doutrina pagã do Hades. Dentro do pensamento grego havia um lugar para onde iam todos os mortos — o Hades. Este era dividido em dois setores: o Elísio (para onde iam todos os bons) e o Tártaro (para onde iam todos os maus). Essa idéia greco-pagã é razoavelmente coerente, pois pelo menos os maus iam para o lugar chamado inferno, que é uma das traduções de Tártaro, e os bons iam para o paraíso, que é a tradução de Elísio.
A passagem bíblica contida em Lucas 16.19-31 tem sido utilizada para chancelar o pensamento acima em alguns segmentos cristãos. No referido texto, Jesus que nos dá informações extremamente relevantes quanto à vida futura. Quanto ao céu e ao inferno. Quanto ao gozo e quanto ao sofrimento eterno. Trata-se da história do Rico e Lázaro. Lembremos:
Ora, havia certo homem rico que se vestia de púrpura e de linho finíssimo e que, todos os dias, se regalava esplendidamente. Havia também certo mendigo, chamado Lázaro, coberto de chagas, que jazia à porta daquele; e desejava alimentar-se das migalhas que caíam da mesa do rico; e até os cães vinham lamber-lhe as úlceras. Aconteceu morrer o mendigo e ser levado pelos anjos para o seio de Abraão; morreu também o rico e foi sepultado.
No inferno, estando em tormentos, levantou os olhos e viu ao longe a Abraão e Lázaro no seu seio. Então, clamando, disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim! E manda a Lázaro que molhe em água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro igualmente, os males; agora, porém, aqui, ele está consolado; tu, em tormentos. E, além de tudo, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que querem passar daqui para vós outros não podem, nem os de lá passar para nós. Então, replicou: Pai, eu te imploro que o mandes à minha casa paterna, porque tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de não virem também para este lugar de tormento. Respondeu Abraão: Eles têm Moisés e os Profetas; ouçam-nos.
Mas ele insistiu: Não, pai Abraão; se alguém dentre os mortos for ter com eles, arrepender-se-ão. Abraão, porém, lhe respondeu: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco se deixarão persuadir, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos. (Lucas 16.19-31)
Do texto em apreço podemos extrair, dentre outras, as seguintes lições a respeito do inferno:
I) As almas que ali se encontram são atormentadas: "No inferno, estando em tormentos".
II) Não obstante, quem ali estiver terá consciência de que os salvos estarão em regozijo e paz: "Viu ao longe a Abraão e Lázaro no seu seio".
III) Não haverá consolo para seus habitantes: "Aqui, ele (Lázaro) está consolado; tu, em tormentos".
IV) Uma vez no inferno, eternamente no inferno: "Os que querem passar daqui para vós outros não podem, nem os de lá passar para nós."
V) Os perdidos clamarão, mas não serão ouvidos: "Eu te imploro".
VI) Já não restarão boas lembranças, bem como será impossível auxiliar os parentes para que também não venham a ir para o inferno.

Quanto à ideia de que o Hades possuía dois “compartimentos”, seus defensores depreendem com base versículo 23: o rico encontrava-se no inferno, e Lázaro junto de Abraão. Conquanto tivessem contato visual, havia entre os locais um abismo intransponível (versículo 26). Tal doutrina é piamente aceita no meio pentecostal.
No entanto, tal pensamento deve ser rejeitado, pois a crença reformada está ancorada no fato de que há dois locais para onde vão os mortos: os que não creram em Cristo diretamente são alocados no inferno, onde aguardam o Juízo Final; já os que morreram no Senhor vão imediatamente estar com Ele. Como exemplo, citemos:
a) As palavras de Jesus proferidas ao ladrão arrependido na cruz: “Jesus lhe respondeu: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso.” (Lucas 23.43)
b) E Paulo escrevendo aos Filipenses: “Ora, de um e outro lado, estou constrangido, tendo o desejo de partir e estar com Cristo, o que é incomparavelmente melhor.” (Filipenses 1.23)

3) Uma versão semelhante à segunda apresenta a possibilidade de Jesus ter proclamado sua vitória aos anjos caídos e, por conseguinte, a derrota eterna dos mesmos.
O maior problema dessa versão não reside no fato de Jesus ter pregado aos espíritos em prisão, o que é líquido e certo uma vez que as Escrituras assim nos asseguram, mas sim sobre quem são esses anjos caídos. Algumas teorias têm sido apresentadas ao longo da História, sem, contudo, podermos chegar a um denominador comum.
Em seu artigo “Revisitando os Espíritos em Prisão: Uma Análise de 1Pedro 3.18-22 e Judas 6”3, Leandro Lima aponta que “muitos dos primeiros pais da igreja seguiram a interpretação judaica que relacionava espíritos aprisionados com anjos que haviam se relacionado com mulheres antes do dilúvio, conforme relata o texto de Gênesis 6.1-2.3”. Para ratificar sua fala, cita a posição de Justino Mártir (100-165 d.C.), Irineu de Lião (130-202 d.C.), Clemente de Alexandria (150-215 d.C.), Orígenes (c. 185 d.C.) e Tertuliano (160-220 d.C).
Para o judeu messiânico David H. Stern,
Os espíritos aprisionados são os “anjos que pecaram” (2 Pe 2.4) e “não mantiveram sua autoridade originária” (Jd 6). Isto é, eles são os b’nei-ha’elohim (filhos de Deus os filhos dos anjos), também chamados nefilim (caídos), que caíram de sua própria esfera, o céu, para a terra, e “vendo (...) que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres” nos dias de Noach (Gênesis 6.2-4).4 (Negritos do autor)
Sobre a queda dos anjos, comentando 2 Pedro 2.4, Calvino afirma que
Muitos homens são curiosos e fazem intermináveis investigações sobre essas coisas; visto, porém, que Deus, na Escritura, tocou só de leve nelas, e, por assim dizer, no que interessava, assim ele nos lembra que devemos viver satisfeitos com este pequeno conhecimento. 5
Relembremos o que nos diz o texto de Gênesis 6.1-4:
Como se foram multiplicando os homens na terra, e lhes nasceram filhas, vendo os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres, as que, entre todas, mais lhes agradaram. Então, disse o SENHOR: O meu Espírito não agirá para sempre no homem, pois este é carnal; e os seus dias serão cento e vinte anos. Ora, naquele tempo havia gigantes na terra; e também depois, quando os filhos de Deus possuíram as filhas dos homens, as quais lhes deram filhos; estes foram valentes, varões de renome, na antiguidade.
Para os “filhos de Deus” do texto supra, há duas principais interpretações, quais sejam:
I) Trata-se dos descendentes da linhagem piedosa de Sete, em contraposição à linhagem ímpia de Caim denominada “filhos dos homens”. É a versão mais aceita atualmente dentre a cristandade, creio que não apenas por convicção com bases textuais, mas principalmente pela dificuldade em adotar o posicionamento a seguir apresentado.
II) Diz respeito ao anjos, que cobiçaram as mulheres da Terra e com elas mantiveram relações sexuais, dando origem aos gigantes apresentados no versículo 4.
Como argumento favorável à posição de que os filhos de Deus a que se referem Gênesis 6 são os anjos, temos dois versículos do Antigo Testamento, a propósito os dois únicos versículos veterotestamentários que apresentam a expressão "filhos de Deus".
São eles:

Num dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o SENHOR, veio também Satanás entre eles. (Jó 1.6)

Tributai ao SENHOR, filhos de Deus, tributai ao SENHOR glória e força. (Salmos 29.1)

Embora somente Jó 1.6 se refira aos seres angelicais de maneira explícita, o contexto de Salmos 29.1 nos leva a depreender que a ordem, em primeira instância, é direcionada a uma assembleia celestial.
Tal posicionamento está também presente na tradição rabínica.
Por outro lado, os que adotam a posição contrária se pautam nas palavras de Jesus registradas em Lucas 20.35,36:
Mas os que são havidos por dignos de alcançar a era vindoura e a ressurreição dentre os mortos não casam, nem se dão em casamento. Pois não podem mais morrer, porque são iguais aos anjos e são filhos de Deus, sendo filhos da ressurreição.

Porém, notemos que a Palavra não nos diz com clareza que as criaturas angélicas são assexuadas, mas apenas que "não casam, nem se dão em casamento". Ademais, outros textos bíblicos nos indicam que tais seres podem perfeitamente assumir a forma humana e agir como nós.6
Quanto à possibilidade de os anjos que pecaram estarem em uma prisão real, João Calvino apresenta a seguinte opinião:
Mas não devemos imaginar um determinado lugar onde os demônios se encontram encerrados, pois o apóstolo simplesmente tencionava ensinar-nos quão miserável é sua condição, desde o tempo em que apostataram e perderam sua dignidade. Pois aonde quer que vão, arrastam após si suas próprias cadeias, e permanecem envoltos em trevas. Sua extrema punição é, entretanto, deferida até o grande dia vindouro.7
Concordo com o questionamento de VanGemeren8, citado pelo Reverendo Leandro Lima, no artigo já mencionado: "Por que cristãos que creem em tantos fatos sobrenaturais da Bíblia têm dificuldade em crer que, de algum modo, anjos caídos se relacionaram com mulheres e foram punidos por Deus?"

Outro texto frequentemente citado com o objetivo de ratificar a descida de Cristo ao Hades é Efésios 4.9,10: “Ora, que quer dizer subiu, senão que também havia descido até às regiões inferiores da terra? Aquele que desceu é também o mesmo que subiu acima de todos os céus, para encher todas as coisas.” Calvino, no entanto, discorda dessa posição. Para o teólogo, quanto às “regiões inferiores da terra”,
Estas palavras nada mais significam que a condição da presente vida. Torturá-las a ponto de fazê-las significar o purgatório ou o inferno, constitui uma excessiva estultícia. O argumento que extraem do grau comparativo é por demais frágil. Aqui se traça uma comparação, não entre uma e outra parte da terra, mas entre a totalidade da terra e do céu; como se ele quisesse dizer: “Daquela sublime habitação, Cristo desceu ao nosso profundo abismo. ”9
Particularmente, entendo que o pensamento que mais se adequa à fé cristã e ao contexto da passagem é o primeiro apresentado no presente capítulo: Jesus pregou por intermédio de Noé aos habitantes pré-diluvianos da Terra.
Mas fato é que há várias vertentes teológicas que tentam explicar tais passagens bíblicas, as quais apontam para a descida de Cristo ao Hades. Católicos, Luteranos, Anglicanos, Reformados, Arminianos, cada um com seu ponto de vista, e com seus textos bíblicos selecionados com o escopo de justificar seu posicionamento. Como eu disse no início do presente capítulo, trata-se de um dos textos mais controversos do Novo Testamento. Graças a Deus que nossa salvação não está atrelada à plena compreensão de tais passagens.

1João Calvino. “Hebreus”, p. 238.
2Revista Fides Reformata 4/1, 1999.
3 Revista Fides Reformata XXI N.º 1, 2016.
4 David H. Stern. “Comentário Judaico do Novo Testamento”, p. 820.
5 João Calvino. “Comentário das Epístolas Gerais”, p. 323.
6Exemplos: Gênesis 18.7-8 e Hebreus 13.2.
7João Calvino. “Comentário das Epístolas Gerais”, p. 508.
8 Teólogo, autor e professor de Antigo Testamento e Línguas Semíticas da Trinity International University.
9João Calvino. “Comentário aos Efésios”, p. 93.


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Soli Deo Gloria

Alessandro Silva

sábado, 23 de março de 2019

O diabo é o pai do rock?


Muito embora não saibamos exatamente qual a origem dessa ligação entre o gênero musical rock and roll e o Adversário de nossas almas, fato é que essa é uma ideia que faz parte do inconsciente coletivo da humanidade. Alguns nisso creem piamente, condenando sumariamente tal ritmo e todos os seus apreciadores ao inferno. Já outros, embora discordem, continuam a afirmar tal premissa, mesmo que de maneira jovial.
Para melhor compreensão desse pensamento, se faz necessário lembrarmos a origem do rock. Suas raízes estão estabelecidas em outro ritmo, o blues, que por sua vez provém dos spirituals e narrativas tradicionais africanas. A “sala de parto” do blues foi o extremo sul dos Estados Unidos, mais especificamente os Estados do Alabama, Mississipi, Louisiana e Geórgia. Já as “parteiras”, foram os escravos que, no século XIX, eram empregados nas plantações de algodão daquela região, e utilizavam tal ritmo para expressar sua tristeza face às longas jornadas de trabalho a que eram submetidos. Lembremos que blues, no inglês, tem como sinônimas as palavras melancolia e tristeza.
O primeiro bluesman que ficou conhecido por citar o diabo em suas composições foi Robert Johnson, na década de 1930. Johnson, aliás, supostamente fez um pacto para obter fama e dinheiro através da música.
Já na década de 1970, despontaram algumas bandas fortemente influenciadas pelo blues elétrico, tais como Led Zeppelin e Black Sabbath, precursores do gênero que ficou conhecido como heavy metal. Mais especificamente o Black Sabbath, apresentava letras e arte visual de seus álbuns explicitamente voltadas às referências satânicas. Já o Led Zeppelin, embora possuísse temática variada, mormente é lembrada como adepta de ensinamentos ocultistas e pelas supostas mensagens subliminares em suas músicas.
Ao longo dos anos, várias vertentes do rock surgiram – thrash metal, death metal, black metal, dentre outros –, com alguns de seus representantes usando e abusando de letras e visual “do mal”, por vezes de maneira espalhafatosa, caricata e mesmo pueril, se autodeclarando servos de satanás. Querem parecer assustadores mas conseguem, no máximo, serem ridículos, com suas maquiagens e indumentárias inspiradas em filmes de terror de quinta categoria.
Mais recentemente, tais recursos tem sido ad nauseam explorados pela banda norte-americana Marilyn Manson, liderada por Brian Hugh Warner, vocalista que assume o mesmo epíteto do grupo.
Apesar de muitos de fato acreditarem na balela apresentada por tais bandas e cantores, é óbvio que tudo se trata de mera jogada de marketing, com vistas ao filão do mercado composto por jovens descerebrados, rebeldes sem causa e mimadinhos de classe média que intentam chocar seus pais e a sociedade com seu visual e preferência musical, mas que conseguem apenas serem mais uma dentre as tribos urbanas frequentadoras de shopping center.
Lembremos que, à luz das Escrituras, satanás utiliza a própria Palavra de Deus para tentar ludibriar o homem e induzi-lo ao erro e ao engano. Foi assim com nossos primeiros pais no Éden (Gênesis 3), bem como na tentação de Jesus (Mateus 4). Ele “anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar” (I Pedro 4.8). Muitas vezes, ele usa pessoas acima de qualquer suspeita para levar a efeito seus desígnios malignos. No caso de Jó, usou a própria esposa do patriarca, a qual foi chamada por Calvino de organum satani 1. Ele tem a seu serviço falsos pastores e falsos mestres, que diariamente se utilizam da mídia para extorquir dinheiro dos fiéis e construir seus impérios pessoais. Eles estão também nas igrejas locais, disseminando heresias e causando divisões.
Esqueça aquela imagem do diabo com a qual você está acostumado e que ilustra as capas dos álbuns e os souvenires ligados a tantas bandas de rock. Tal imagem está mais relacionada a figuras lendárias e à mitologia do que à descrição do adversário apresentada na Bíblia. Esta, aliás, não apresenta pormenores sobre a aparência do inimigo de nossas almas.
No entanto, no Antigo Testamento há dois textos que por vezes são apresentados em prédicas e estudos como sendo referências veladas a Satanás. São eles: Isaías 14.12-23 e Ezequiel 28.12-19. Vejamos:

Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filho da alva! Como foste lançado por terra, tu que debilitavas as nações! Tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte; subirei acima das mais altas nuvens e serei semelhante ao Altíssimo. (Isaías 14.12-14)

Filho do homem, levanta uma lamentação contra o rei de Tiro e dize-lhe: Assim diz o SENHOR Deus: Tu és o sinete da perfeição, cheio de sabedoria e formosura. Estavas no Éden, jardim de Deus; de todas as pedras preciosas te cobrias: o sárdio, o topázio, o diamante, o berilo, o ônix, o jaspe, a safira, o carbúnculo e a esmeralda; de ouro se te fizeram os engastes e os ornamentos; no dia em que foste criado, foram eles preparados. Tu eras querubim da guarda ungido, e te estabeleci; permanecias no monte santo de Deus, no brilho das pedras andavas. Perfeito eras nos teus caminhos, desde o dia em que foste criado até que se achou iniquidade em ti. Na multiplicação do teu comércio, se encheu o teu interior de violência, e pecaste; pelo que te lançarei, profanado, fora do monte de Deus e te farei perecer, ó querubim da guarda, em meio ao brilho das pedras. Elevou-se o teu coração por causa da tua formosura, corrompeste a tua sabedoria por causa do teu resplendor; lancei-te por terra, diante dos reis te pus, para que te contemplem. (Ezequiel 28.12-17)

Muito embora possa parecer que os textos em questão se refiram a Satanás, os contextos apontam claramente para o rei da Assíria (no caso de Isaías) e para o rei de Tiro (para a profecia de Ezequiel). Logo, qualquer interpretação que fuja disso é mera conjectura, apesar de que inclusive alguns pastores reformados defendem a tese de que os textos em apreço são referências ao Inimigo.2 No time daqueles que discordam disso, cito J.I. Packer, o qual afirma que
Alguns têm pensado que os termos com que são descritos os orgulhosos reis de Tiro e de Babilônia, em Ezequiel 28.11-19 e Isaías 14.12-14, respectivamente, devem sua origem às narrativas tradicionais da queda de Satanás, cuja imagem aqueles arrogantes reis estampavam de maneira notável; mas essa opinião não pode ser provada.3
Quanto à aparência do diabo e seus legionários impressa no inconsciente coletivo dos cristãos, temos algumas possíveis explicações: as asas de dragão são baseadas na descrição metafórica de Apocalipse 20.1,2: "Então, vi descer do céu um anjo; tinha na mão a chave do abismo e uma grande corrente. Ele segurou o dragão, a antiga serpente, que é o diabo, Satanás, e o prendeu por mil anos [...]."
Os pés, os chifres e a barba, podem ter inspiração nos sátiros, seres mitológicos, ou ao deus grego Pã. Já a cor vermelha, uma das cores quentes, alude ao fogo. Na “Divina Comédia”, Dante Alighieri o descreve como um ser peludo portador de três cabeças, com asas enormes semelhantes às dos morcegos.
Gostaria de ilustrar o presente capítulo com uma frase atribuída ao Rev. Augustus Nicodemus (desconheço a fonte):
"Quando Judas ficou possesso por satanás, não caiu no chão, não revirou os olhos, não falou em voz diferente, não ficou doente ou encurvado, não ganhou uma força descomunal. Simplesmente saiu e foi ganhar dinheiro vendendo Jesus aos sacerdotes (Lucas 22.3-6). Tem muito mais gente possessa por satanás do que se pensa."
Parafraseando:
Quando uma pessoa está a serviço de satanás, ela não vai ouvir rock'n'roll. Ela sai e vai estuprar, matar. Dentre esses, vemos distintos senhores muitíssimo bem trajados e ocupando cargos importantes na sociedade, fãs de samba e pagode cujo passatempo é abusar sexualmente de crianças e adolescentes. Jovens de classe média-alta, ouvintes de sertanejo universitário, que matam os pais para ficar com a herança. Pais fãs de MPB que maltratam e até mesmo tiram a vida de seus filhos por motivos fúteis. Políticos apreciadores de música clássica que desviam verbas destinadas à saúde e a educação, fazendo com que milhares de pessoas padeçam por conta de sua inconsequência. Tem muito mais gente possessa por satanás do que se pensa.

Talvez alguém possa afirmar que o ritmo musical ora em pauta tenha o poder de influenciar negativamente seus ouvintes. Mas, dependendo do conteúdo lírico, qualquer outro ritmo musical pode exercer esse poder.
(Quanto à paráfrase acima apresentada, quero deixar claro que nada tenho contra quaisquer gêneros musicais. Ilustrei minha fala com diferentes ritmos para expor a ideia de que o mal não está atrelado à música que se houve, mas à corrupção do coração do homem.)

1Instrumento de satanás, em latim.
2Hernandes Dias Lopes e Paulo Anglada são dois exemplos. Vide o comentário bíblico “2 Pedro e Judas” (p. 64), escrito pelo primeiro, e “Soli Deo Gloria” (p. 206), de autoria do segundo.

3J.I. Packer. “Vocábulos de Deus”, p. 132.

(Texto extraído do meu livro "A realidade do sofrimento eterno - E como escapar dele", disponível no Clube de Autores).


Soli Deo Gloria

Alessandro Silva